quarta-feira, 12 de maio de 2010

Com a palavra: Toni C

Toni, o blog é de projetos para o Brasil. Para o povo brasileiro. Que precisa ser incluído, não só na economia e na democracia, mas também na cultura.

Salve Walter. Satisfação ser convidado para este debate em seu blog. Se é um espaço para os que precisam ser incluídos, “então é nóis mesmo” (como agente costuma falar). Certa vez escrevi num artigo alguma coisa mais ou menos assim… “Se somos a maioria que precisa ser incluída. Por que não invertemos? Trancamos esta meia dúzia do lado de dentro e fazemos a festa do lado de fora. A festa dos excluídos! Afinal a elite só existe por conta da maioria excluída.” É uma maneira de dizer que não há saída individual para problema coletivo.

… uma elite que dá as costas a seu povo não constrói uma nação.

Bela frase Walter. Por isso estamos nós o povo construindo a Nação verde amarela, a Nação Hip-Hop, tem esse nome não é atoa.
O que quero de vc é falar sobre Brasil, juventude, cultura, hiphop, o que pensa alguém da tua geração e extração social…
Interessante você perguntar o que pensa essa juventude. Há quem acredite que a juventude de periferia não pensa. Tenho um vizinho que conhece cinema como ninguém, diz que tenho que ver Scorsese, emenda na apresentação de cineastas africanos, dizendo a filmografia a sinopse, os atores… o cara conhece tudo. Eu fico admirado com a eloquência que tem um cara como o Mano Oxi do RS. A sapiência do Jucka, um cara que mora no extremo sul da zona sul e além de rapper é professor de filosofia e para enfrentar o desinteresse dos alunos na aula dos pensadores gregos. Propôs que fizessem um rap sobre os filósofos, ai surgiu rap sobre Sócrates, Platão… Veja o Aliado G, por exemplo. Um rapper do interior de São Paulo, que não tem um diploma universitário. Já ví ele em debate engolir reitor de universidade, senador, repórter. Tem quem use essa inteligência para abrir carro forte, invadir banco sem disparar o alarme. Tudo isso para mostrar que talento nasce em qualquer lugar, o que falta é oportunidade.

Bem, então vamos lá: foto e pequena bio.

Sou Toni C. Sou DJ, produtor, escritor, publicitário, trabalho no Portal Vermelho desde sua fundação, hoje atuo na TV Vermelho. Sou também organizador dos livros Hip-Hop a Lápis e coordenador do Ponto de Cultura Hip-Hop a Lápis. Fundei e estou na direção da Nação Hip-Hop Brasil.

O Brasil está bombando nestes anos de Lula. Não só na economia, como também no orgulho nacional, Brasil está em alta. Como você sente esse problema na realidade da juventude, sobretudo na dimensão artística…

É comum agente brincar que é cada vez mais difícil fazer movimento social. Agente marca reunião e um não vem por que está trabalhando, outro por que entrou na faculdade pelo prouni… e a culpa é desse governo Lula.

Agora na dimensão artística como chamou. Vejo dois movimentos antagônicos. O primeiro são as ações dos Pontos de Cultura, revolução cultural nos grupos de cultura popular. Poderíamos falar só sobre isto, mas basta dizer que fomos parar nas páginas do New York Times, falando do nosso Ponto de Cultura Hip-Hop a Lápis. Célio Turino quando me encontrou falou que foi a primeira vez que uma ação do governo Lula aparecia no jornal de modo positivo. De lá pra cá o barbudo aparece na imprensa internacional de modo positivo todo momento.

A segunda questão aprendi com Malena, líder do grupo feminino da argentina Actitude Maria Marta. Que se apresentou no 3º Encontro Nacional da Nação Hip-Hop Brasil que fizemos em São Vicente no começo do ano. Para Malena não é só no Brasil, mas a América Latina passa por uma onda de governos mais populares e progressistas. No entanto a cultura não tem evoluído ainda a altura.

Boa essa, é verdade. América Latina está em alta, enquanto a velha Europa é cada vez mais velha e conservadora. Agora, mestre, você é um produtor cultural popular, da nação hiphop, que marca a cena cultural da periferia. Desde o surgimento disto (do qual você participou) como você vê a evolução do movimento?

No movimento hip-hop não é muito diferente da questão anterior. Do ponto de vista cultural e artístico o mercado fonográfico está fadado à falência. Enfrentamos uma fase complicada, por diversos motivos, um dos principais é a perseguição e boicote desse governo Demo-Tucano em São Paulo. Estamos às vésperas de mais uma Virada Cultural, é só ver o histórico que essa gente tem conosco.

Por outro lado, na questão política e reconhecimento institucional. Nunca houve tanto reconhecimento, com alguns membros do movimento eleitos parlamentares em suas regiões, participação de assento no Conselho Nacional de Juventude desde sua fundação. Até mesmo editais específicos para o movimento como o Prêmio Preto Ghóez com 1,7 milhões para o hip-hop.

Agora sobre a Nação Hip-Hop, vou me dando conta que é a maior concentração de Notório Saber da periferia, são os intelectuais da rua e de quebra a maior entidade de hip-hop do mundo.

Você está se aventurando em TV na internet? Você é da equipe de Vermelho, é isso?

Como nas respostas anteriores parece contradição, né!? É a tal dialética, não é isso? Foi publicado na edição 7 da revista Juventude.BR do Centro de Estudos e Memória da Juventude – CEMJ, um artigo de minha autoria no qual me referenciei na teoria da Outra Globalização Possível do geógrafo Milton Santos. Ele diz que a revolução virá dos de baixo. Construída com a sucata tecnológica da burguesia. Segundo ele a juventude periférica tem mais facilidade para assimilar e acompanhar as inovações tecnológica. Eu produzir vídeos na TV Vermelho é uma mostra disso, as rádios comunitárias é outra mostra. Whyte Jay à frente dum programa de hip-hop na TVE-RS e o Hot Black (Ganso) no programa Periferia agora em rede nacional pela TV Brasil são outros exemplos. “Agente se vê por aqui” é o slogan da maior emissora do país. Como agente não se vê. Criamos nossos próprios meios.

Vamos fazer agora um intervalo cultural? Já que falei de um geógrafo, aqui vai o clip do Grupo Inquérito do parceiro Renan, formado em geografia na UNICAMP. Vejam que genial, Mister M.

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Você sente a juventude mais politizada? Participante do processo político? Prouni e Reuni foram importantes para isso, não?

Essa juventude espalhada pelas periferias está mais preparada para enfrentar o debate político em todas as esferas. Para dar um único exemplo, basta ver na eleição anterior: houve mais de 30 candidaturas do movimento hip-hop em todo país.

Dilma ou Serra? Por que?

Ah! essa é fácil, responderia com os versos do Zeca Pagodinho: “Deixa a Dilma me levar. Dilma leva eu…” Mas como é sempre bom argumentar. Não vou responder pois não sou a voz da periferia, mas conheço um cara que é e faço minhas as palavras dele. Com vocês Mano Brown:


Fale sobre o livro Hip-Hop a Lápis – Literatura do Oprimido? Esta é a segunda publicação…

O livro acaba de sair com um conceito herdado de Paulo Freire. Por isso literatura do Oprimido. Hoje é fácil ser otimista. Mas mesmo nos piores temores da década de 90. No auge do neoliberalismo, com FHC privatizando tudo, desemprego… Na academia se dizia que a história havia acabado, que não existiam mais conflitos, o fim da luta de classes e toda essa conceituação pós-modernista do multiculturalismo e tudo mais. Nas periferias já havia como ainda tem um outro discurso, uma outra atitude. Quando acaba o gás num barraco o vizinho empresta o dele. A comunidade se junta de madrugada para encher a laje e assim vai saindo mais um puxadinho… Tem um verso de um músico que começa assim: “Acharam que eu estava derrotado. Quem achou estava errado.” Isto foi escrito por Dexter preso no Carandirú e ele está preso até hoje. É uma história auto-biográfica, mas é também a história de um torneiro mecânico que perdeu um dedo, mas ganhou a presidência da república na quarta tentativa e se tornou “o cara”, o homem mais influente do mundo. É a história do povo brasileiro, tão sofrido, mas sorri. E isto tudo influência na música, na política, nas artes plásticas, na dança, na arquitetura e na literatura. Se eles estão vivendo no pós-modernismo, nós vivemos uma outra era, que eu chamo de hip-hop. Essas e outras histórias é a literatura do Oprimido. Um livro que tem mais escritores que a Academia Brasileira de Letras. Estamos fazendo história e história não morre, jamais.

“Do grafite quebrado dentro do lápis, na mão calejada, saem com medo, trêmulas, as primeiras palavras. Até o mais valioso dos diamantes brilhando na vitrine, tudo é carbono.
Segundo um senhor simples, de feições serenas, olhar morno, gestos lentos e rosto enrugado. Ao ver a agilidade da rima, a flexibilidade da dança, as cores da pintura em spray e o som alto dos toca discos. Falou de forma pausada, na sagacidade de sua sabedoria: “O hip-hop é o diamante bruto que deve ser lapidado pelos revolucionários”, João Amazonas.
Ainda há tempo. A literatura do Oprimido, definitivamente, não serve para narrar o mundo, mas sim para transformá-lo!” (Trecho do livro Hip-Hop a Lápis – Literatura do Oprimido.)

E como você entrou no PCdoB?

Eu já militava na UJS em Carapicuíba onde moro e era sempre enquadrado por algum dirigente para me filiar no PCdoB. No geral via partidos como time de futebol, pode haver um jogador bom num time ruim, ou no time adversário. E dizia isto, que não via sentido em torcer sempre para o time vermelho ou o azul. Poderia atuar politicamente sem vestir camisa de partido algum. Eu não era contra arguentado ha contento. E foi Jorge Amado que me filiou neste partido. Foi necessário ler Os Subterrâneos da Liberdade para conhecer um pouco do histórico, mas também da prática e postura do Partido Comunista. Aí que vi que pode ter jogador bom, mas time revolucionário é o Partido do povo, como dizem os camaradas do Partido da classe operária. Nem precisei ler a trilogia completa.

Mestre, queria isso mesmo da entrevista: algo por esse rumo para não deixá-lo muito encucado não.

Legal você dizer que não precisa ficar educado. Tá aí uma coisa que não sou, “educado”. Tem uma introdução de uma música antiga assim: “Em meu país dizer a verdade é falta de educação.”

Pra continuar sendo mal educado, Walter, deixa eu contar uma coisa que me impressionou muito. Foi em 2008 em Atibaia no curso de formação do Partido. Quando você apresentou o conceito de política de quadros. Você dizia que não é necessário a pessoa abdicar da vida para militar no Partido. Que não é necessário a pessoa abandonar a família, os projetos pessoais, o estudo, a formação pessoal, etc. Para a pessoa exclusivisar a atuação política.
E para cada uma dessas coisas eu pensava comigo: – Não!?Pois é! Aquilo me soou tão novo…

Já disse a você que discordo do nome “política de quadros”, pra mim “quadro” é justamente o oposto disso. Não consigo ver de outra forma. Aquele que consegue conciliar a família, realizações pessoais, estudos, com as tarefas partidárias, não é um quadro, é um revolucionário. Temos que ter política para estes.
Ah! agora ví que falou “encucado”, e eu aqui todo mau educado (risos).


Gostei da conversa e quem quiser continuar a troca de idéias, pode seguir no www.vermelho.org.br/hiphop ou ainda me contactar pelo toni@vermelho.org.br .

Vamos fazer um sorteio Walter? O primeiro que mandar um comentário pelo blog sobre esta nossa conversa ganha o novo livro Hip-Hop a Lápis a Literatura do Oprimido. Eu providencio o livro e você a correspondência para o internauta, ok?

Cara, adorei. A irreverência é o sinal de consciência crítica. Isso não falta a vocês da nação. Olhe, se puder, mande músicas da turma que eu ponho no meu blog. E se puder ajudar mande o Aliado enviar algo, nem que seja poesia dele, já que essa é a linguagem que ele mais domina (ao que parece). Eu ponho até poesia dele – ou então música! Abração a vocês.

Pra incentivar o Aliado a participar, mando um vídeo produzido a partir de seus versos http://www.youtube.com/watch?v=RPCzDCN5hIs

T+. TC.

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